domingo, janeiro 06, 2008

O dendroclasta ternurento

Uma das árvores da minha infância - uma velha figueira vizinha da Escola do 1º Ciclo do Rodrigo (Covilhã)



As árvores da nossa infância enchem a atmosfera

de sonhos, as chaminés dos nossos olhos encerrados

têm o dom lacrimal de alumiarem o séquito de cera,

que se arrasta barrigudo por muralhas e mercados.



Eu tinha uma figueira que estava presa contra

um tórax de caliça e um pombal de múmias afinadas.

Trazia-lhe muitas vezes a minha urina monstra,

a minha pele compungida e as minhas mãos aladas.



E quando frutificava, os filhos cheiravam a berros

e a outras aflições perfumadas, e o leite pingava

como nas noites desenfreadas de nascer-se a ferros.



A figueira dos meus pesadelos ceifou-me os pulmões

e, zelosa, tem-nos pendentes como troféus de lava,

são às centenas, filtrando o ar de chorudos nevões.


(Do amigo) Rui Ramalhinho

5 comentários:

Márcio Meruje disse...

A figueira que foi também minha ;)!

Porque recordar é viver, parabéns pela foto !

Pedro Nuno Teixeira Santos disse...

Suponho que esta figueira seja um pouco de todos os que estudaram naquela escola...

Um abraço, bom ano!

ljma disse...

Agora é um pouco também do meu filho, de oito anos. Ainda hoje de manhã ficou a olhar para ela, notando que, com os seus dois braços principais abertos (não se notam bem do ângulo em que a fotografia foi tomada), parece a letra "V".
Abraço!
José Amoreira

Pedro Nuno Teixeira Santos disse...

José,

Acho muito curioso e interessante que esta figueira tenha "despertado" e continue a despertar este interesse.

Junto a ela, eu e os meus amigos, "construímos" a nossa rampa de lançamento das naves da "Galactica" (a nossa série de culto há 25 anos atrás).

É só pena que as crianças de hoje que aí estudam e brincam já não o possam fazer sob a copa das tílias, mas sim sob esses "monstros deformados" que nem sombra dão (e daí a história da tela de que já falamos!).

Um abraço.

Márcio Meruje disse...

Já não sou do tempo da "galactica" mas joguei bastantes vezes às "pirolitas", no chão barrento, à sombra dessas tílias.

A modernização da escola, realizada a alguns anos, veio em boa altura mas esquecemos algumas vezes (DEMASIADAS) dar o verdadeiro realce a estes gigantes verdes .

Gigantes verdes . Que somos nós a seu lado ?

Bom ano também Pedro :)

Abraço,